quarta-feira, 6 de junho de 2012

À Nossa imagem e semelhança


Gênesis 1.26-31

26Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra.
27Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.
28E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra.
29E disse Deus ainda: Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento. 30E a todos os animais da terra, e a todas as aves dos céus, e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhes será para mantimento. E assim se fez.
31Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. Houve tarde e manhã, o sexto dia.

A humanidade falhou. Vivemos em um ecossistema em desiquilíbrio, com o qual vivemos em uma relação de inimizade (tal como o Mickey e o Pato Donald com as abelhas, tornados e afins). Duas guerras mundiais e uma contínua instabilidade internacional acabaram com a nossa esperança de paz mundial. No dia-a-dia em nosso trabalho, o outro deixou de ser um colega e passou a ser um competidor. Apesar de todo progresso, mulheres ainda têm salários menores que os homens; o racismo ainda acontece sutilmente; eruditos desprezam os menos “entendidos”; seja na política, nas empresas ou no campo, poucos ficam ricos à custa da exploração de muitos; os governantes se tratam no Sírio Libanês e os pobres morrem na fila do SUS; os ricos fazem faculdade no exterior e os pobres têm progressão continuada mesmo sem saber ler o jornal. Madames levam seus animais de estimação em spas, enquanto crianças pedem esmolas nos semáforos.
Tudo isso deriva do individualismo em que vivemos. Como se alguns (muitas vezes nós mesmos) tivessem valor maior que outros. Como se o mundo e as pessoas fossem algo que só existe quando eu preciso: aí eu me conecto com eles (ou fico “on”) até que eu enjoe ou não precise mais deles. Como se eu não tivesse obrigação nem com Deus, nem com o próximo, nem com o meio ambiente.
De certa forma, tudo isso existia no mundo do AT. O mar era visto como um deus que poderia matar aqueles que se aventuravam nele (veja o livro de Jonas no AT, ou Poseidon na Odisseia de Homero). Doenças e morte eram mais comuns. Reis e sacerdotes colocavam-se como deuses ou representantes divinos explorando muitos. Povos viam outros povos como seres inferiores e passíveis de serem escravizados (como o povo hebreu no Egito). Os mais fortes, os mais sábios e os mais ricos viam-se como superiores (Jeremias 9.23). Políticas internacionais eram resolvidas nos campos de batalha. A comida do pobre (e seus próprios filhos) era visto como despojo de guerra ou como oferenda aos deuses.
Neste contexto, Gênesis 1.26-31 é revolucionário. Ele diz que Deus criou o homem (todos os homens, de qualquer sexo, raça, credo, idade, nação ou lugar na sociedade) à Sua imagem e semelhança. Isso quer dizer que homens e mulheres; crianças, adultos e idosos; brancos, negros, índios e asiáticos; pobres e ricos; reis/ governantes e escravos; executivos e faxineiros; cultos e analfabetos...todos são iguais aos olhos de Deus e, por isso, igualmente dignos de honra.
Portanto, ninguém pode ser explorado ou oprimido; mulheres devem ter os mesmos salários e espaço que os homens; a opinião dos iletrados e incultos deve receber o mesmo tratamento que a dos eruditos e especialistas no assunto; todos têm direito ao mesmo padrão de vida, ao mesmo acesso à saúde e educação, conforto e prosperidade; todas as nações têm direito à mesma tecnologia e aos mesmos subsídios, assim como todas as línguas têm direito ao mesmo evangelho; todas as cidades e bairros têm de receber a mesma consideração no planejamento anual etc.
Este texto também nos mostra que Deus criou um ser relacional (homem e mulher). Isso deve ter sido um choque para as religiões da época que só viam no homem um servo dos deuses e nada mais. Assim, fomos criados para o relacionamento com Deus (e não para o ateísmo); para o casamento heterossexual sadio (não para a solidão ou o homossexualismo); para a paternidade/ maternidade muito mais que para nos tornarmos donos de um animal ou para resolvermos um casamento ruim; para vermos no próximo um irmão (não um competidor capitalista); criados para viver em comunidade, amando e conhecendo o próximo intimamente (não no isolamento ou em relações precárias via facebook). O próximo não é um objeto para o meu benefício, prazer, distração ou enriquecimento; muito menos Deus. Fomos criados para a pessoalidade, com Deus e com o próximo.
Além disso, Deus abençoa-nos para que dominemos sobre a terra. Essa é a finalidade de sermos à imagem dEle e de nos multiplicarmos e enchermos a terra, pois Ele quer reinar (e continuar a criar e por ordem no caos) sobre ela através de nós. A relação do hebreu com a terra deveria ser mutualista: ele se beneficiaria dela, mas também a protegeria (Gn 2.15). Assim, somos ordenados a usá-la para nosso benefício (não capricho), mas também a lutar pela restauração/ preservação do meio ambiente, a lutar contra o caos e a morte nela.
Agora, a imagem de Deus e a capacidade para o relacionamento com Ele e com o próximo, bem como a ordem na criação, foram arruinadas pelo pecado, mas Cristo é aquele que nos faz novamente ser à imagem de Deus (2Co 5.17) e capazes de sermos um com Ele e com o próximo (Jo 17.20-21), além de fazer novas todas as coisas criadas. Ele incumbiu a Igreja com o dever de levar essa realidade a todas as pessoas e lugares, usando de palavras, mas também de ações. A fim de que, através dela, o Criador reine soberano, sobre todas as pessoas, lugares e situações. Pois viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom.

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